Antonio de Albuquerque
Sorrindo de alegria, num espaço sublime entre contos, encantos e poesias.
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Antonio de Albuquerque
Velho Sam da floresta

Há algum tempo queria ir à santa Izabel um distante município do Amazonas, localizado no alto Rio Negro. Voei num hidroavião até próximo a cidade e numa embarcação naveguei num afluente do Rio Negro por doze horas chegando a cachoeira Açu, lugar aonde montei o acampamento para me encontrar com Sam.

Em minha companhia estava Teodoro meu bom mateiro em excursões pelas florestas e seu cachorro Pernalonga, medroso, porém mais valente que o dono porque quando pequeno, me lembro bem, a primeira onça pintada que ele encontrou, fugiu para o acampamento como se tivesse pernas de dois metros, tal a razão de Pernalonga, embora seja uma criaturinha corajosa. Seu dono, Teodoro é um sujeito rabugento metido a corajoso, mas só tem conversa, porém entende tudo de floresta e eu o tolero em minhas excursões. Trouxemos a embarcação para terra firme, guardamos os mantimentos, mostrei a
Pernalonga um lugar para dormir na voadeira, (embarcação regional) coberto com uma lona e quando o relógio apontava dezessete horas já estava com a barraca pronta, e os mantimentos guardados, Pernalonga havia jantado sua ração e aguardávamos Teodoro que havia ido pescar dois Tucunarés de cinco quilos para nosso jantar. Eu ainda não sabia quanto tempo faltava para o grande encontro com Sam, esperado há muito tempo.

Enquanto assávamos os peixes ouvindo o cantar dos Tucanos e os distantes rugido das Guaribas parecendo bem pertinho, à noite chegou calma e serena, avistei o céu pintado de astros e estrelas e a Lua prateando a água da cachoeira. Já não escutava o cantar ritmado dos Tucanos, mas o trilar das corujas da noite, dos macacos voadores, o rasgar dos morcegos, os movimentos dos roedores, onças rugindo, as manadas de Javalis, marcando sua presença na floresta escura. O buliço da água das cachoeiras era intenso e constante e somado ao trilar dos pássaros da noite criava uma vibração ritmada diferente de tudo que eu escutara, conduzindo meu espírito ao céu da natureza encantada.

Estava feliz imaginando a grandeza do Criador, encontrava-me em um espaço diferente e num instante, tangido pelo silêncio profundo ouvia até a minha respiração. Adormeci conectado com a fauna e a flora no jardim da natureza. Acordei as quatro horas com chuva e trovões, mas era uma chuva passageira, e com ela foram os trovões e relâmpagos, e o dia clareou. Entre as ramagens das árvores surgiram raios dourados do Sol e com eles, após profundo silêncio, ouvi um cantar melodioso, como jamais ouvira, era o uirapuru anunciando o nascer do dia e depois do seu cantar a passarada invadiu a mata, cada um gorjeando mais bonito que o outro, no alto as araras, os papagaios, maritacas e andorinhas tingiam o céu formando uma belíssima tela da natureza.

Acendi o braseiro, fiz café e com o tempo nublado só enxergava à dez passos, Pernalonga apareceu com dois patos sendo a nossa primeira refeição do dia. À qualquer momento poderia ter sinal da tão desejada presença de Sam, meu velho bom amigo e sábio. O que ele teria a me revelar marcando encontro depois de vinte e oito anos? Nem mesmo eu sabia. Pelo rio três canoas se aproximaram, dentro uma tripulação formada por dois remadores. “Por ordem de Sam viemos buscá-los”, disse um deles. Eram homens fortes, resolutos e cordiais. Deixamos em terra a embarcação "voadeira" e embarcamos nas canoas. Uma hora depois chegamos a uma linda aldeia de casas bem construídas, entre elas uma maior onde fomos recebidos por uma comissão de boas-vindas formada por mulheres e homens de bela aparência falando Nheengatu e sorrindo nos ofertaram vinhos e frutas naturais.

Aceitei e naturalmente perguntei por Sam, que me respondeu: “ Estou aqui meu bom amigo, há quanto tempo!  "Nos abraçamos, e nos afastamos do grupo tendo uma longa e proveitosa conversa; você nada mudou após vinte e oito anos, disse eu. “Aqui a vida é muito mansa, natural e a energia é pura e estamos numa boa vibração com a natureza, transmito bons ensinamentos para alguns e assim as pessoas evoluem, a Terra passa por uma profunda transformação e está numa vibração negativa, as pessoas inverteram o valor das coisas, a moral e a ética tomaram rumos diferentes, com as pessoas tendo diversos entendimentos sobre a natureza, quando puder diga isso para seu círculo de pessoas e peça para elas combaterem essa inversão em todos os segmentos da sociedade para salvar o planeta de uma catástrofe. Não podemos viver à margem, nos refugiando em lugares como esse, mas com firmeza de propósito acreditando no grande Arquiteto do Universo podemos salvar a Terra de monstruosa tragédia nuclear.

O que pode salvar o homem é a ciência, o conhecimento espiritual e naturalmente o entendimento da diferenciação do que matéria e espírito. ” Concluiu sua mensagem o velho Sam. Tivemos outras conversas que guardo em sigilo em razão de estarem sujeitos a não ser entendidas no momento, preferindo trazê-las oportunamente. Tivemos um dia festivo com farta alimentação, danças e histórias dessa pequena civilização, histórias que são contadas de boca a ouvido através dos tempos. Voltei para Manaus refletindo sobre tudo que vi, senti e aprendi com o velho Sam, imaginando como poderei mudar para melhor minha vida atribulada de cidade grande.

Sobrevoando a floresta atapetada de matas e rios, refleti poestar voando sobre trilhões de toneladas de minérios estratégicos, e quase toda a água doce da Terra, como é possível uma criança filha desse riquíssimo continente verde sobreviver em condições miseráveis em seu fecundo solo! O barulho das turbinas da aeronave, o trepidar das grandes cachoeiras, se confundiam na minha lembrança, sem poder entender como sendo legítimos donos de uma imensurável riqueza, milhões de brasileiros e habitantes de nações vizinhas ainda vegetam, sobre essa riqueza,  carentes de alimento, educação, saúde, segurança e amor! Muitos, ainda, não têm um Tapiri para se abrigar!
Antonio de Albuquerque
Enviado por Antonio de Albuquerque em 27/08/2018
Alterado em 24/09/2018
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